quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Na floresta quase mágica (primeira parte)





Em certo tempo perdido na história, numa floresta quase quase mágica, vivia uma feiticeira já velhinha. Passava os seus dias a fiar a lã do destino, a mexer o caldeirão da vida, a cuidar das ervas dos Deuses, nos seus afazeres repletos de conhecimentos que morreriam com ela pois não tinha descendentes.

Esta anciã solitária vivia atormentada com o passar dos dias e com a sua caminhada lenta para a morte, sem deixar a alguém tudo o que aprendeu da sua mãe, da sua avó e, acima de tudo, da vida.

Deixar todo aquele conhecimento ser queimado com ela, desaparecido nos dias do tempo... Que desperdício!

Seria uma lei do destino que ela propria fiara?

Seria uma prova a superar?

Nunca quis casar, nem ter filhos. Não confiava em ninguém. Embora as 240 estaçoes que tinha pesassem, preferia continuar isolada na sua cabana, perdida no meio daquela floresta quase mágica.

Num final de tarde, Fern afastou-se um pouco mais que o normal da sua rota de ervas e foi até à margem do rio para encontrar algumas ervas que só cresciam ali.

Quando se aproximou do rio começou a sentir um cheiro muito estranho no ar: fumo?
- Será que a floresta está a arder? - pensou ela.
Nesta altura do ano eram muito comuns os incêncios na floresta devido ao calor intenso que Litha trazia, juntamente com o descuido daqueles que por ali ousavam instalar-se. Tentou seguir o rasto do fumo e a certa altura, já o fumo era intenso, como novoeiro cerrado, ouviu gritos e ... um choro de criança? Seria?

Largou as suas ervas, correu na tentativa de ajudar alguém que estaria em apuros. À medida que adentrava naquela estufa fumarenta , o calor era cada vez mais intenso, mas ela corria incansável até chegar a uma clareira com uma casinha de madeira. Estava já em chamas altas, que alastravam num fogo destruidor pela floresta fora. De dentro da casa ouvia os gritos, o choro da criança, vidro a partir-se devido ao calor do incêndio incontido!

Desesperada, sem saber como ajudar, dirige-se à entrada da casa que cuspia labaredas e entra coberta pela sua capa, tentando proteger-se daquele fogo sedento.

A casa estava a ser completamente consumida pelas chamas, tentou subir as escadas para chegar à origem dos gritos e do choro, mas não conseguia!

Disse em gritos para se fazer ouvir:
- Está aqui ajuda! Estou aqui para tentar ajudá-los! Mas não consigo subir!

A resposta não tardou:
-Salve a nossa bébé, por favor!

Era uma familia que ali vivia com uma pequena criança de apenas 4 estações!

Naquele momento uma parte do primeiro andar da casa desaba, e com ela as escadas, já em chamas. Numa pequena ilha, ainda de pé encontravam-se os pais e a criança em pânico e logo abaixo Fern, sem conseguir subir, sem saber o que fazer.

A mãe apenas conseguia dizer:
-Salve a nossa filha, por favor, salve-a.

Sem conseguirem pensar muito bem, os pais da criança, tiram as roupas do seu próprio corpo e ataram-nas todas numa corda para a descer até Fern. Conseguiram e Fern saiu de imediato para que a criança respirasse e não morresse devido ao fumo que inalava. Mas prometeu aos pais:

- Eu vou procurar ajuda!

O pai diz:

-Cuide da nossa menina, isso é o que mais importa agora!

Ao sair coberta pela sua capa e a proteger a criança, a casa desaba consumida pelas chamas intensas que lavraram centímetro por centrímeto da sua área e com ela os pais daquela menina, entregue aos seus braços, a chorar como se percebesse que tinha acabado de perder aqueles que a trouxeram ao mundo.

Fern chorava, assustada, sem saber o que fazer. Apertou a criança contra o peito e disse:
- Estás a salvo, eu vou cuidar de ti, shhh!

Na roupa da menina, havia um alfinete que dizia: Indrin.

Era o nome da menina. Com a casa desfeita à sua frente, a floresta a ser consumida pelas chamas Fern começa a embalar a criança com a canção de embalar dos anjos:
"Dorme, dorme anjinho do céu
Dorme hoje que amanhã outro amanhacer se ergue
Sonha lindo anjo, sonha alto
Voa como um pássaro..."

(continua...)

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